Sem título

Alguns assuntos são clichês não por vontade daqueles que escrevem, mas pelo limite da mente humana. Por maiores que sejam os homens, os mistérios divinos são infinitamente superiores. Então, falar da morte é como falar do amor: quem não viveu não compreende e acha aquilo tudo demasiadamente clichê. Quem vive, percebe o porquê do clichê. A diferença é que na morte as pessoas respeitam mais do que no amor. O problema é que achamos que amamos só aquelas pessoas contadas. Estranho é perceber que você amava aquela que já se foi. E agora? Caímos, então, no lugar comum, nas filosofias de bar, nas músicas exaustivamente tocadas para nos trazer a emoção, nos e-mails com Power Point.

Não te chamo "menina de ouro", "filha prodígio", "jovem cheia de vida". Falarei aquilo que foi possível em conhecer-te. Tudo aquilo que te chamarei, falarei pela boca de outras pessoas. Outras pessoas que tiveram a sorte de te conhecer melhor. Eu não te conheci. Nossas vidas eram opostas pela humanidade da nossa família. Duzentos e oitenta quilômetros, quatro horas de viagem, cinco anos de diferença, defeitos. A morte é redentora, anunciei algumas semanas atrás. Ela é capaz de unir uma família. É a prova cabal de que a sua definição é o encontro com Deus, com Aquele que também morreu para que você não morresse. E você não morreu; você vive o que, mais cedo ou mais tarde, todos nós viveremos. Poderíamos viver o céu na Terra, preferimos deixar a nossa humanidade interferir na vontade de Deus e somente percebemos o significado da palavra família quando algo tão inexplicável como a morte une-a uma vez mais.

Tu eras uma menina de ouro. Teu pai nunca disse essas palavras na minha frente, mas eu ouvia seus olhos falar. Falava com um orgulho tão grande de ti que nem era necessário dizer o quanto tu significas para ele. Não consigo imaginar o sofrimento de um pai que vê o ciclo da natureza sendo alterado. Alterado sem que nos seja dado saber o motivo. É isso que mais revolta. Se não tivermos Cristo em nosso coração, cairemos no erro de revoltar-nos contra Ele. Jogando blasfêmias contra sua face, supondo até sua inexistência. Nem tudo possui resposta aos olhos humanos, e é aí que voltamos nosso olhar para Deus. É Ele a resposta para todas as tuas indagações, tio. Hoje, tua filha vive a maior busca e alegria do homem: contemplar a face de Deus, do Pai que mesmo antes de tu imaginar tê-la, Ele já reservava essa alegria a ti.

Eu não te conhecia, mas sei o quanto tu prezavas por tua família. Nesse ponto, assemelhamo-nos e vemos nossa característica voltar à base da nossa família: nossos avós. Eram pais dos nossos pais e pais dos filhos deles. Assim como não te conhecia, pouco conheci vovô e vovó. Não por opção, pois era uma criança. Mas e quanto a ti? Vivemos a consequência das nossas escolhas, das escolhas de nossos pais. A morte unirá todos ao redor de ti. Unidos nas lágrimas, nas orações e em coração. Como uma família. Será que ficaremos, mais uma vez, limitados à efemeridade do momento?

"As pessoas morrem para que tenhamos consciência da importância delas em nossa vida."

Finalizo com uma frase que sintetiza tudo aquilo que tentamos falar da morte. Ela é absoluta, como Deus. Minha alegria? A certeza de que tu farás ainda mais pela tua família ao lado dEle.

Obrigado, prima, por tudo que fizeste pela nossa família. Obrigado, porque tu fazes agora, mesmo quando todos eles acham que não. Sim, eu te amei, pois queria que você vivesse. Te amei, porque Victor e Olga colocaram com suas preces de avós o amor inerente à família em meu coração.

5 comentários:

Vitória disse...

Tudo acontece da maneira que deveria acontecer e não há dúvida sobre isso...

André Palhano disse...

a morte causa esse efeito nas pessoas, meu amigo! e eu acredito que ela estará apenas continuando o papel que cumpria conosco! =)

Vitória disse...

Deu uma enorme vontade de chorar!
"Descobri, afinal, que não teremos a graça de tantos irmãos como aquele."
Me deu uma emoção muito forte, daquelas que não sabemos explicar. Me fez sentir uma paz interior que só eu sei!

Ficou mesmo parecido... E lindo!


(você disse que queria um comentário onde você achasse fácil)

ramiro teixeira disse...

E como escreveu Grecco na música "Cara de família":
"...e não sabem dar valor pra essas coisas...ter um lar é um tesouro."

Vitória disse...

Sim, sim! No meu blog, mais embaixo e do lado direito tem "Links". Lá tem o meu profile.