Interno

Não sou muito de colocar minhas preocupações mais íntimas. Alguns até estranharam essa frase, mas é verdade. O que falo, por mais íntimo que possa parecer, não é necessariamente tudo que posso falar. Desde que criei "O menino que não se lembrava", estava com esse post pronto para sair. Digo logo: não tenho assunto definido. Estou seguindo o que minha (extremamente ativa) mente me disser. Pensei, pensei, pensei... Coloco isso ao final ou ao começo? Creio que os dois.

"Eis aqui um que não fará grande carreira no mundo, as emoções o dominam."

De Machado de Assis. Homem que me faz pensar, divagar, entre outras coisas. Talvez por sua análise acerca da nossa (falha) humanidade encaixar-se sempre ao que vivo. Parece que lê-lo é ler a prévia da minha vida. Ler Machado me faz, por um tolo momento, imaginar "Ah, entendi tudo isso. Estou sábio, não cairei nas armadilhas da vida". Percebo que não é assim. A sabedoria só vem com a vivência. Numa discussão filosófica extremamente inusitada com meu amigo escritor, falávamos da sabedoria. Não me lembro ao certo como chegamos a isso, mas lembro-me de uma frase que ele me disse:

"Aqueles que passam a experiência do que não viveram, não são sábios, são pseudo-sábios."

Verdade. Poderia explicar por que concordo, mas deixo para quem quiser entender. Chamaria, ao invés de pseudo-sábios, fariseus. Isso não vem ao caso. Não farei grande carreira no mundo, as emoções me dominam. Para quem não me conhece tanto (em grande parte porque não me deixo conhecer), pode soar estranho. Às vezes pareço por demais duro, seco, insensível. Nunca pensei que eu fosse capaz de esconder o que realmente há por trás da minha ironia e do meu sarcasmo. As emoções me dominam. Pensei ser capaz de fugir à nostalgia, à auto-enganação de que o passado fora melhor, mais brilhante, menos defeituoso. Por um tempo consegui. Não consigo mais. Passo horas a imaginar aquilo que não existiu, a divagar o que teria acontecido se eu tivesse um pouco mais de tempo, ou se a distância fosse um pouco menor. Odeio tratar esses assuntos com trivialidade, com simplificações toscas. E hoje estou assim. Como se a distância ser menor, o tempo ser maior, fosse apagar minhas falhas, meus empecilhos, minhas paranóias, meus dramas, meu pseudo-autismo. Por que diabos eu estou fazendo isso? Como é que eu, uma pessoa que sempre teve isso tão formado em sua cabeça, se engana com uma coisa tão simples como essa?

Lembro-me de um trecho do diálogo em Vanilla Sky, em que o Suporte Técnico diz:

- Você baseou todo o seu Sonho Lúcido numa pessoa que só vistes duas vezes em tua vida inteira. Mas toda tua nova vida, todo teu sonho, foi baseado nela. Ela te amou de verdade, David.

Esse filme foi o maior formador de meu caráter. Foi ele que me disse "Acorda, Thiago, tua vida não vai ser um romance clichê com uma música dos anos 80. Acorda!" E esse despertar me rendeu lágrimas. Lágrimas e mais lágrimas, que me impossibilitaram de falar por quase meia hora. Hoje, nem concordo tanto com o filme, mas doeu perceber que aquele amor (hoje tão tosco para mim) só existiria em momentos efêmeros da tua vida. Não o amor em si, mas ser correspondido em sua plenitude, só aconteceria uma vez na sua vida. E eu já tive a minha dose por essa vida. Não acredito mais que o "Ela te amou de verdade" fosse suficiente para que David e Sofia formassem um típico casal de filmes americanos. Mas

- Você nunca mais viu Sofia novamente.

dói. Ainda hoje. Não sei por que, ainda hoje choro com esse filme. Talvez nostalgia. Talvez loucura, talvez drama, talvez idiotice, talvez imaturidade, talvez infantilidade, talvez desespero, talvez falsa sabedoria, talvez angústia, talvez inquietação, talvez tristeza, talvez...


"Eis aqui um que não fará grande carreira no mundo, as emoções o dominam."