Dos sentimentos humanos

Dos sentimentos superficiais

Pensei em começar o texto com o clichê “O que há com o mundo?”, ou então “Parem o mundo que eu quero descer.”. Não sou afeito a clichês, provavelmente os leitores desse blog sabem disso. Apesar de frases utilizadíssimas, não estaria errado utilizando-as para começar o texto. Mas eu não quero descer do mundo, quero mesmo é ver tudo que ele tem pra me mostrar, seja bom ou ruim, para que eu possa observar, apreender e escrever sobre tudo que ver. E sobre mais uma observação venho prosear. A da vez é: sentimentos superficiais.

Ao mesmo tempo em que as pessoas se encontram cada vez mais próximos da solidão, mais fogem dela. Aceitável, o maior medo do homem é se ver sem ninguém. Mesmo os mais auto-suficientes e orgulhosos, que nunca admitiriam tal verdade, temem estar só. Até já comecei a escrever um conto sobre isso, mas perdi o princípio, depois o meio, e perdi, por fim, a paciência. E nesse infindável medo, as pessoas correm tanto da solidão que se esquecem de um detalhe: o outro. Sim, aquele ao seu lado. Apesar de soar inacreditável, ele também tem sentimentos, medos, qualidades, defeitos, e principalmente: um coração.

E como reação à fobia, começam as relações casuais e paixonites agudas que tem duração de 1 nanossegundo sob a perspectiva do Universo. Numa semana, encontra-se aquela mulher que parece ter vindo diretamente do céu para preencher em ti um vazio (que não deveria existir). Os olhos azuis dela parecem ter sido feitos pessoalmente por Deus, a beleza dela é simplesmente angelical. E então, a certeza de que ela nasceu para ti e vice-versa. Busca-se então um contato, uma conversa. Ela parece ser extremamente simpática, e tua certeza só vai aumentando. Passam-se os dias, uma semana, e tu percebes que ela, apesar de simpática, é fútil, falsa, entre outras características que não mais te agradam. E vem a dor, com certeza ela seria a mulher da tua vida, e agora como vai passar o resto da vida só? Mas, dois dias depois, chega à conclusão de que, na verdade, o amor da tua vida é aquela que miras naquele momento...

Nesse ciclo vicioso, pessoas passam anos, entre “amores enlatados” e vazios pós-frustrações-amorosas. Alguns doem mais, outros menos. Também há os casos que é ele quem frustra a mulher. Por qualquer defeito, imaginou não darem mais certo e pôs fim, machucando da mesma forma que era machucado. Em conversas com os amigos, costuma dizer: “Poxa, cara, ta difícil encontrar uma pessoa ideal para namorar, tenho tentado tanto, mas elas são raras.” Seu grupo de amigos eram quase 10 homens, todos solteiros. Um ano depois, eram somente 6 solteiros. Mais um ano se passou, e somente sobraram 3. Mais alguns meses, e só havia dois deles solteiros. Um desses era ele. Percebeu que todos os seus amigos encontraram pessoas “ideais” para namorar. Por que não ele? Imaginava não ter sorte. E assim continuava a sua busca, em que em menos de uma semana tinha carinhos de namorado com uma moça, na seguinte já não era mais a mesma. Seu vazio somente crescia. Não entendia que cometia falhas em dois pontos:

1. Seu vazio jamais seria preenchido por esse amor, seja ele enlatado ou o que todos nós já ouvimos falar.

2. Será mesmo falta de sorte não encontrar alguém? Será mesmo que todas as mulheres que encontrara tinham defeitos fatais? Ou o defeito não estava nele mesmo?

E eis o maior problema nesses sentimentos superficiais: as pessoas crêem de todo coração que preencherão o que lhes faltam em suas vidas com um amor de filme dos anos 80. Uma pena. Às vezes até conseguem encontrar alguém que supra quase tudo, mas ele vê o quanto estava errado ao definir o que é amor.

“(...) o amor não é aquilo que a gente pensa quando começa. Não são apenas beijos que se trocam ou palavras sussurradas ao ouvido, ou sentir-se apertado um contra o outro; o tempo da vida é longo, o dia de núpcias é apenas um dia, e, em seguida, tu te lembras? É só em seguida que a vida começa.

É preciso fazer o que está desfeito; é preciso refazer, pois está desfeito ainda. É preciso fazer.”

João Batista Xavier

Eis aí o que é amor, mas somos novos e inexperientes demais para compreender.

Thiago Luiz



Homenagem

Ontem (15/09/2008), faleceu aos 65 anos o tecladista do Pink Floyd, Richard Wright, vítima de câncer. Representou para os fãs do Pink Floyd o fim da esperança em ver a banda mais uma vez junta, e completa (incluindo Roger Waters), tocando por uma última vez, para nós, fãs mais jovens. Não poderia deixar esse fato tão significativo para mim passar batido. As músicas do Pink Floyd, juntamente com as leituras de Machado de Assis, foram o início do meu interesse em ler cada vez mais, buscar cada vez mais entender quais são os mistérios desse mundo que nos rodeia. Foram, principalmente os primeiros, que me fizeram começar a observar o comportamento, e suas peculiaridades, das pessoas que habitam o mesmo mundo que eu. Observação essa que foi mais aguçada com Machado de Assis.

Na obra-prima do Pink Floyd, The Dark Side of the moon (DSOTM), que é o 4º disco mais vendido da história do rock, ficando mais de dez anos entre os mais vendidos da parada americana, Richard Wright se destacou pelo seu teclado que captava o momento e passava a quem o ouvia e pelas suas composições. No DSOTM, as principais foram The great gig in the sky e Us and them, destacando-se a última pela beleza do piano e a primeira por tratar da própria morte.

Como esse blog fala de experiência pessoais, destaco dois momentos principais em que Rick Wright mostrou-se um inigualável tecladista:

1. Em Shine on you crazy diamond (Part I – V), do álbum Wish you were here (1975), no princípio da música (e no decorrer dela), há um teclado lisérgico, psicodélico, que, para mim, resume em alguns minutos as características do Pink Floyd;

2. Em Dogs, do álbum Animals (1977), Wright mostra sua capacidade de adequar o teclado às situações. Numa fase mais ácida do Pink Floyd, em que as críticas tornaram-se mais comuns e incisivas (nesse álbum critica-se o capitalismo como um todo), seu teclado também adquire um ar mais furioso. Nessa música, demonstra-se uma outra característica de Wright e do Pink Floyd: seu entrosamento com David Gilmour. O solo de guitarra começa aos 2 minutos de música e se estende até quase o 8º minuto. Nele, percebe-se como a guitarra e o teclado se completam, como ambos passam uma fúria raramente vista na música. O vazio deixado por um é completado por outro e vice-versa e no momento em que os dois tocam simultaneamente, é quase desnecessário cantar-se algo para sentir o que deseja ser passado.

Por ter participado ativamente da banda que mudou minha forma de pensar tão profundamente, deixo aqui minhas homenagens e meu pesar pela morte do mais genial músico da banda, Richard Wright.

2 comentários:

André Palhano disse...

Bela definição de amor! ;D

aquele texto rendeu, hein?

ah!, esses amores descartáveis... sei não, sei não!

Suzane Borba disse...

"É preciso fazer o que está desfeito; é preciso refazer, pois está desfeito ainda. É preciso fazer.”
Sábio João Batista Xavier...

Ótimo texto, melhor ainda pra quem precisa de umas verdades... eehueheuehue

Beeeeeeeeeeeeeeijo!