Estudantes Enlatados! (Protestar ou não?)

Mais uma vez, é possível que não seja do conhecimento de muitos o meu interesse em lados políticos. Não com a politicagem, mas com a "Direita ou esquerda, eis a questão." Acredito que não me encaixo no perfil de nenhum dos dois. Contudo, se fizéssemos por aproximação, eu seria um direitista. Capitalista, porco selvagem, etc. Em momentos passados, isso se fez mais gritante em minha vida. Hoje em dia, nem tanto, apenas algumas coisas que me fazem rir e querer chorar ao mesmo tempo. Nunca escrevi sobre isso aqui (exceto na resenha sobre o livro "A revolução dos bichos", mas nada demais), contudo, um fato isolado somado à inércia do blog me fez abordá-lo.

Saí do meu trabalho e fui à parada do conhecidíssimo Secular (assim chamo carinhosamente nosso fiel companheiro Circular). Enquanto esperava, um homem, fumante (manteve-se longe, sem me fazer fumante passivo, graças a Deus), chegou à parada e começou a gritar "Estudantes Enlatados!". A princípio, pensei que sua revolta fosse com o circular. Não entendia o motivo, já que a frota foi aumentada e continuava de graça. Procurei ouvi-lo com atenção, apesar de nem ser tão necessário, já que seu tom de voz era bastante elevado.

Reproduzo, com a fidelidade que minha memória me permite, o que ele disse:

- É! Vão tudinho pagar 2 reais daqui a um mês! Dois reais! Estudante enlatado! Meia é 1 real! Ae ninguém quer saber de protestar... "Eu pago meia. É um real só!" Estudante enlatado! Ninguém protesta, ninguém faz nada! Na minha época, não era assim!

E começou a mesma sessão nostálgica que muitos cheguevaristas fazem quando reclamam da falta de atitude da juventude de hoje. De fato, concordo com "antes era melhor". Na minha época, que foi há 5 anos atrás, nem tanto tempo, ainda era diferente, com um pouco mais de atitude. Imagino como os mais velhos sentem hoje. Sua repetição maior era ao "Estudante enlatado!". Como toda pequena frase, comecei a tentar entender o motivo de sermos enlatados. A mais óbvia era que nós estávamos enlatados no ônibus. Depois, pensei que ele poderia estar chamando-nos enlatados devido à nossa inércia.

Um dia, eu já protestei. Não me arrependo. Tudo é fonte de crescimento. Hoje, penso diferente. Para mim, são extremos. Não sou contra o protesto, mas o maior problema dos brasileiros é a covardia e a alienação juntas. Muitos vão pelo oba-oba. Embriagam-se, drogam-se, entre outra coisas. Não estou julgando, falo pelo que já vi. Isso significa que eles estão ali enquanto é só uma bagunça; quando toma dimensões maiores, com polícia e briga, dispersam-se. Quer protestar? Ótimo, proteste. Mas saiba bem pelo que estão lutando e se prepare para ir até as últimas consequências. E com últimas consequências eu quero dizer, sem ter como ser mais claro, partir para os finalmentes. De que adianta gritar, espernear, fechar o trânsito e simplesmente fugir quando chega alguma autoridade. É praticamente um paradoxo. Somos contra a arbitrariedade da autoridade, por isso inviabilizamos o trânsito de uma avenida. Quando essa mesma autoridade aparece e utiliza de autoritarismo para conseguir o que quer, simplesmente nos curvamos. "Não me curvo à autoridade, desde que ela não esteja presente com um porrete na mão." Falar é bom que pode falar tudo. O maior problema de quem fala muito é a hipocrisia.

Do lado completamente oposto, acho que se o protesto não pretende ir às últimas consequências, não proteste. Acredito, concordando com uma tese de um livro que li, que a estagnação dos níveis sociais se deve à própria inércia dos níveis baixos. Esse é um dos motivos pelos quais não é mais tão comum ver pessoas pobres atigindo a riqueza. É mais confortável reclamar da "ambição desmedida", dos "lucros exorbitantes", do "egoísmo", etc. Não digo que eles sejam inexistentes, mas reclamar à sua vizinha não vai mudar em nada. Difícil é encontrar alguém que pense "Tenho menos dinheiro, tenho que encontrar uma forma de ganhar mais". Digam o que quiser, mas o capitalismo privilegia a criatividade. Mas isso requer inspiração e o mais difícil para todos: transpiração. É melhor continuar só reclamando. Pensam "Esses donos de empresas são todos iguais, todos egoístas, ambiciosos." ao invés de pensar "É? Querem aumentar a passagem? Vou juntar meu dinheiro para comprar meu carro e ser um a menos a dar lucro." Aí me vem com a filantrópica ideia de "E aqueles que não têm como fazer isso?". De fato, o capitalismo tem uma enorme face triste, mas não vou ser hipócrita ao afirmar que estou me matando num protesto para que aquele que não tem como pagar uma passagem a esse preço possa continuar pagando. Acredito que ninguém tenha coragem de me dizer uma mentira dessas. Sou adepto da ideia "Faça seu próprio protesto com suas próprias forças".

"Na minha época, era melhor". Será? Somos filhos daqueles que lutaram para a volta (ou a vinda?) da democracia. Somos também filhos de suas frustrações. O maior problema de tais lutas é que, quem luta, coloca aquilo como centro de sua vida. Às vezes, é melhor para o ativista que nunca alcance seus ideais. Ele lutará até o fim de seus dias por aquilo. O maior problema de quem alcança, um dia, aquilo pelo que batalhou, em termos políticos, é perceber que seus ideais eram... idealizados. Perceber que a primeira pergunta que se faz quando alcança um objetivo idealizado é "E agora? O que eu faço?". Perceber que a luta política não deveria ter sido o centro de sua vida, pois ela é apenas uma de tantas lutas que nós, humanos, passamos em nossa existência. Nós apenas demos demasiada importância a ela. Foi exatamente isso que aconteceu à geração precursora à nossa. Batalharam pela democracia e alcançaram. Trocaram o sistema, mantiveram as pessoas. Trocaram as pessoas, mantiveram a impossibilidade de perfeição delas. E, por ser idealizado, imaginamos líderes perfeitos, deuses. Isso tudo causou a frustração, refletida em nossa inércia como ativistas. Vivemos numa época em que nos é incutido que essa luta é inútil, que o que vivemos é imutável. E assim acreditamos, sem protestar individual ou coletivamente.

No final, resolvi levar na brincadeira toda a gritaria do homem. E a cada "Estudantes enlatados!" eu gritava. Brincava com seu protesto. Era o que muitos queriam fazer e não podiam. E ele respondeu, como eu imaginara, aos meu gritos:

- É, vai pagar dois reais na passagem! Playboy!

E foi aí que relembrei as minhas maiores decepções com a esquerda. A primeira é pensar (paranoicamente, pois para mim isso é paranoia) que todos aqueles que discordam de você ou que ousam (uau!) brincar com algo tão sério é apenas um "alienado", "playboy", "inimigo do povo", já diria Stalin.

A segunda foi perceber que essa paranoia é causada por algo muito mais sério: o ódio cego (redundante mesmo). O ódio cega.

Um comentário:

André Palhano disse...

É, meu amigo. Você já está se livrando dessa. Daqui um mês, mais ou menos, vai estar com a CNH nas mãos! :D