Os mistérios da Divindade

Dia 30 de dezembro de 2008. Quatro dias para o Acampamento de Jovens Shalom que eu tanto esperava. Dinheiro já certo para a inscrição. Ansiedade ia a mil. Quando, nesse exato dia, descubro que o dinheiro para minha inscrição não poderá ser utilizado por motivos de força maior. A seis dias do acampamento, tinha exatos 0 reais dos 100 que precisava. Então, a primeira pergunta, quase em retórica, que me vem à mente é: Deus quer que eu esteja lá? Um amigo, que foi meu anjo da guarda nessa semana tão difícil, talvez a mais difícil que passei desde minha entrada no Shalom, convenceu-me de que era vontade dEle, sim, que lá eu estivesse. Vamos batalhar pelo dinheiro então. Como? Logo, lembrei-me (ou Ele me fez lembrar) que eu tinha 20 reais na carteira e 20 reais guardados. Porém, eu precisaria passar uma semana vivendo a pobreza ao extremo, não poderia gastar NADA, porque os vintes reais da minha carteira era meu dinheiro até o dia do acampamento. Decidi-me por fazer isso. Tinha, então, 40 reais, mas me faltavam 60. Em 6 dias. Como?

Não me restavam alternativas, a não ser deixar meu orgulho de lado, arregaçar as mangas e fazer tudo que fosse possível. Vender qualquer coisa, aceitar sem besteiras o dinheiro alheio. Se é da vontade de Deus, deixemos o orgulho de lado. Comprei adesivos. Exatamente vinte e oito adesivos. Se vendesse todos, teria, em mãos, 61 reais. Faltariam trinta e nove. O Shalom estava organizando a venda de cocada na praia. Precisava participar, se quisesse conseguir o dinheiro. Pedi que me avisassem quando seria.

Quinta-feira, tinha 47 reais em mãos. Precisava saber da venda das cocadas. Pedi a duas pessoas que me dissessem. Já se aproximava das dez horas da noite e eu não tinha notícias. Desanimei-me por inteiro. Tive vontade de chorar. Resolvi então reclamar tudo Àquele que me aguenta sempre. Não sabia mais se realmente era da Sua vontade minha presença lá. Pedi uma luz. "Tu queres mesmo que eu esteja lá? Pelo amor de Deus, tá difícil demais!" Meu celular toca. Estranho. Nunca deixo meu celular ligado enquanto oro. Atendo. Meu anjo da guarda:

- Boy, amanhã, de 8hrs da manhã, na praia de Ponta Negra, a venda de cocada, ok?
- Beleza, brigadão, boy!

Eis minha resposta. Na verdade, não deu certo a venda. Mas eu entendi: "Tu estarás lá, Thiago."

Sábado: 49 reais. Fui ao Shalom e vendi todos os 18 adesivos restantes. 67 reais. Como conseguir 33 em dois dias? Eu não tinha mais o que fazer. Mais uma vez, meu anjo da guarda:

- Oh, meu dinheiro saiu e talz. Quanto tu precisar, pode me falar, ok?
- Ok, boy. Valeu.

Deram-me dez reais ainda. Peguei 23 com ele. Meu orgulho estava vencido. Era totalmente de Deus naquele momento.

Acamp's, aí vou eu!

E lá Deus me foi claro. Disse-me por que quis tanto que eu lá estivesse. Mas disse só no último dia, no apagar das luzes, aos 45' do segundo tempo. Mandou-me fazer coisas inimagináveis a mim. Fui cumprindo suas ordens. Amando quem eu nem conhecia, desfazendo todo meu orgulho, minha auto-suficiência, deixando-me, literalmente, prostrado aos Seus pés. Disse-lhe, inúmeras vezes:

- Dai-me forças para meu esvaziamento. Tirarei tudo que tenho dentro de mim, absolutamente tudo, para que Tu possas me preencher por inteiro. Quando eu transbordar, serás somente Tu, não meu cansaço, meu desamor, minha indiferença. Serás somente Tu.

Se Ele me deu essa força, somente Ele sabe. Mas era isso que Deus queria. E amei. Amei como nunca fui capaz de amar. E não sou capaz. Ele me fez derramar lágrimas por quem não conhecia. Por conversões de desconhecidos, por curas de estranhos, por angústias de anônimos. E eu chorava, como uma criança. Como se não conhecesse Aquele que me amava naquele momento.

Doía saber que algumas pessoas ainda não tinham O encontrado. Doía perceber a busca incessante de tantas pessoas e não conseguir encontrá-Lo. Implorei que amasse aquelas pessoas. Batia no chão de desespero. E perguntava:

- Por que Tu não corresponde a eles?

Minha inocência, minha ansiedade, minha pressa, minha sinceridade, tudo numa pergunta só. Pergunta tão tola, tão inverdadeira, tão...

Mas continuei fazendo tudo que Ele me pedia. Era-me difícil. Não via nada acontecendo. Até a sexta-feira. Quando, no momento da Efusão, Ele veio me amar de novo. Veio me preencher. E eu me senti, pela enésima vez, completo por causa dEle. E chorei. Chorei e chorei e chorei. Quando vi Sua entrada, somente poderia fazer aquilo que fora feito durante o Acampamento inteiro: prostrar-me aos seus pés. Não merecia ser amado assim. Não eu, que O questionei, que O coloquei contra a parede, que O traí, não O compreendi, não O esperei. Para Ele, não importava.

"Ele só sabe nos amar."

Essa frase ecoava em minha cabeça. Lágrimas e mais lágrimas. Precisava estar perto dEle. E fui. Olhava-O diretamente. Tudo que eu via era amor. A cada novo olhar, novas lágrimas. Quando levantei minha cabeça, vi, talvez, a cena mais bela do Acampamento: um jovem, que usava drogas, ajoelhado, diante dEle, com os braços estendidos, os olhos fechados e os lábios a cantar.

Então, Deus pediu-me coisas mais difíceis. Aquilo que não poderia ser dito à toa. Aquela palavra que não se joga fora. Eu precisava dizer. Eu precisava anunciar aquilo. Segui-O, ainda, para derramar lágrimas que diziam:

- Eu não mereço. Eu não mereço.

Levantei-me, e fui em busca daquela pessoa à qual Ele me fez amar o acampamento inteiro. Aquela pessoa que eu não conhecia. Aquela pessoa que não estava nos meus planos. Mas aquela pessoa que estava nos planos dEle. Ela precisava ouvir aquilo. Eu precisava dizer. E, enquanto ela O encontrava uma vez mais com os olhos mais amorosos que é possível existir, eu encontrava o amor gratuito, a humildade, a dependência dEle. E chorei. Uma vez mais. Somente pude chorar e dizer:

- Obrigado. Obrigado por ser tão misterioso, mas mesmo assim me ser incapaz de não o amar. Obrigado. Obrigado por não amar somente a mim. Obrigado por não cessar de buscar a humanidade. Obrigado por se entregar por mim. Obrigado por aceitar minhas infantilidades. Obrigado por me amar. Eu não mereço, por isso: obrigado. Eu Te amo.

3 comentários:

Guilherme Melo disse...

Ótimo texto... melhor ainda quando a gente faz parte da história!

abração, meu amigo

André Palhano disse...

rapaz, que sufoco, hein? ;D

se vc tivesse pedido a mim, teria arranjado num instante! mas acho que da forma como ocorreu foi mais recompensante.

abraços!

Amanda Conrado. disse...

Deus realmente queria que você fosse...
Texto liiindo, parece que o dom não é só meu né?! :D