- Então é isso? - perguntou ela, apenas sussurrando, com os olhos imersos em lágrimas.
- Não. Quando se trata de nós dois, nunca será "somente isso". O que aconteceu ficará em nossas mentes por muitos anos. Creio que até o fim de nossas vidas.
- Você dizia que me amava!
- Dizia - as palavras dele pareciam advindas de um filósofo, cuja fala é pausada e cada sílaba rodeada de sabedoria.
- Mentias para mim?
- Jamais o fiz e jamais faria. Entenda uma coisa: o amor é eterno, como eu sempre te falei. Só amei uma vez durante quase 3 décadas de vida. E todo meu amor foi dedicado para ti.
- Então... Como podes simplesmente finalizar um relacionamento tão duradouro?
- Não é fácil. Por favor, me entenda!
- Explique-me! Pelo amor de Deus! - pela primeira vez ela mostrava todo seu desespero com o fim de um relacionamento de quase meia década.
- Em minha vida, sempre tive em mente que, não importa a profissão que escolhesse, eu seria o melhor. Essa é a nossa função: servir, com eficiência, ao sistema e morrer. Sem sentimentalismos, nostalgias e outras baboseiras. Não quis ter apego profundo a nada e a ninguém. Ainda assim você roubou meu coração. Por todo esse tempo fui somente seu. Mas chegou o nosso momento.
- Por quê? Eu também tive meu coração roubado por você! Durante nossa vida juntos, jamais pensei em alguém além de você. Acredite em mim!
- Não se preocupe. O fim não é por isso.
- Então, por quê??? - a fala tornava-se difícil devido às lágrimas que caíam incessantemente.
- Tudo bem, vou tentar me fazer mais claro - não sabia ao certo como falar a verdade. Apesar de estar decidido a fazer o que tinha de ser feito, ainda a amava muito. Como antes. Por isso, tinha medo. Resolveu, contudo, tentar.
- Por favor, minha angústia está se tornando insuportável!
- Como eu disse, sempre tive meu objetivo, que era ser o melhor naquilo que eu fizesse. Se me formasse em engenharia, seria o melhor. Em medicina, idem. Assim por diante. Estudei uma vida inteira para isso, pois sonhei por todo esse tempo ter em minha lápide os seguintes dizeres: "Eis a mais assídua cria do sistema" - ao perceber o olhar de horror nela, explicou-se - Esse é o nosso admirável mundo novo. Talvez seja mais difícil para algumas pessoas aceitar, mas eu não me importo em admitir a nova lei vigente.
- Lei vigente?!
- Sim. "Serve com eficiência, sem amor próprio ou ao próximo, pois o sistema requer todo teu suor." Essa é a nova lei. E eu não tive nenhum problema em admiti-la como verdade. Porém, ao te encontrar, me perdi de tudo que aceitava como verdade. Comecei a acreditar no amor. Hoje percebi que errei.
- Errou...
- Sim. Há duas semanas convidaram-me para um alto cargo na diretoria de uma empresa. Na hora, aceitei. Eles me disseram que eu não podia simplesmente aceitá-lo. Explicou que eu tinha duas vidas: a de um profissional eficiente e batalhador e a de um namorado amoroso, com devaneios juvenis. Eles sabiam de tudo. Falaram que a máquina sabe de tudo. Eu teria que escolher. Mostraram-me o quanto eu perdia em eficiência por causa desse "amor". Por fim, aconselharam: "Você já teve a dose de amor de sua vida. É o suficiente." E, assim, eu resolvi fazer o que deveria ser feito há muito tempo.
- Então... Esse é... o motivo?! - mal se ouvia sua voz.
- É. Diga adeus e será nosso fim, que deveria ter ocorrido há muito tempo.
Não conseguiu. Tudo que pôde fazer foi deitar-se encolhida no chão. Já não se ouviam mais os prantos. As lágrimas continuavam caindo. Agora silenciosas. Havia entendido: era o fim.
Ele a olhou por um instante. Friamente, avaliou que fez o que foi designado para fazer com eficiência. Virou-se de costas e saiu calmamente do quarto, tendo o cuidado de fechar a porta. Era o início.
=)
Thiago Luiz
3 comentários:
Auto-crítica:
História com a base já trabalhada por muitos. Essa tem algumas coisas mais "viajantes", vamos pôr dessa forma. Perdoem-me se foge ao que falo no blog, mas fui influenciado por:
Sigur Rós - Bium Bium Bambaio
É... lembra muito 1984! =)
Já o leu?
Já tava com saudade de texto novo ;D
Beeeeijo, Tito!
Adorei, como sempre ;)
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